FONTES DOCUMENTAIS PARA O ESTUDO DA ARQUITETURA RELIGIOSA EM MINAS
1. “Relato dos fatos notáveis da
Capitania” (SILVA apud BAZIN, 1983) 5, escrito em 1790 pelo Vereador Segundo da Câmara de Mariana, Capitão Joaquim José da Silva: documento fidedigno.
2. estudo clássico de Rodrigo José Ferreira Bretas intitulado “Traços biográficos relativos ao finado Antônio Francisco Lisboa” (BRETAS, 1951) 6, publicado pela primeira vez em 1858 na “Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro”.
- biografia de Aleijadinho
- projeto civilizatório de Araújo Porto-Alegre (academicismo francês)
- IHGB: projeto romântico nacionalista de criação da nação.
- busca das celebridades regionais, em busca de um panteão dos heróis nacionais.
- texto descoberto e trazido à tona pelos modernistas do IPHAN.
- mito da criatividade brasileira (mestiça)
- Aleijadinho e arquitetura barroca: síntese do Brasil dos brasileiros
- Mário de Andrade: superioridade do mulato no campo artístico. Introduz o novo e portanto a divergência com o modelo ultramarino.
IPHAN:
- busca de uma identidade cultural brasileira. (Rodrigo Melo Franco de Andrade e Mário de Andrade).
- a idéia de que o século XVIII em Minas tinha produzido no campo das artes e da arquitetura algo genuinamente nacional, que representava exatamente o protótipo estético que se buscava como bandeira da cultura nacional e da criatividade do povo brasileiro, representado pela genialidade mulata.
- No discurso modernista incorporado à fala de Rodrigo Bretas a estratégia era revalorizar a arte local para integrá-la no programa em voga de redescobrir as raízes da arte brasileira, com ênfase nos seus aspectos culturais e de miscigenação racial.
Os modernistas, assim, personificaram na figura do Aleijadinho um herói nacional
híbrido, que tinha como missão o resgate de uma unidade improvável entre as raças brasileiras e da qual o manuscrito relatado por Rodrigo Bretas nos seus “Traços biográficos do finado Antônio Francisco Lisboa” (1951) foi tratado como peça fundamental para dar a legitimidade histórica para a construção de uma consistência documental, influenciando os ensaios e publicações sobre a arte e arquitetura mineira no século XVIII de toda uma geração.
ALEIJADINHO DOS MODERNISTAS
- figura genial do Aleijadinho: artista brasileiro nato, mulato oprimido pela segregação social que, através do seu talento transportado para sua obra artística e arquitetônica e do seu sofrimento, tornava-se símbolo de resistência cultural e racial brasileira e podia ser elevado ao título de “Patrono da Arte Nacional”
- ngação de influência externa: criatividade. Conceito de barroco mineiro
GUIOMAR DE GRAMONT E O ALEIJADINHO
A biografia primordial de Aleijadinho nasce, como as biografias românticas, no momento em que a individualidade, até então figurada como a unidade de um ethos, passa a ser subjetivada psicologicamente, com um dentro e um fora, uma alma cheia de intuições geniais e uma circunstância histórica adversa, contra a qual tal alma se debaterá, expressando em obras imortais o seu sofrimento redentor de si mesma e dos outros. Individualidade, porém, construída das imagens coletivas que a precederam. Para fazer o renome de um personagem são necessários muitos nomes, muitas histórias recolhidas da tradição. “Aleijadinho” é uma tópica e, como tópica, é uma coleção de topoi, de lugares comuns. Essa é a história de uma personagem construída na memória brasileira como as biografias renascentistas, onde, segundo Burke, o efeito é semelhante ao dos retratos publicados nos livros dos séculos XV e XVI, em que uma única matriz de madeira era usada para imprimir retratos de diferentes indivíduos. (GRAMONT, 2002, p.38)
POLITICA DE PRESERVAÇÃO DO PATRIMONIO CULTURAL
- É no vigor da era Vargas, que o projeto de proteção da memória nacional vai ser encampado como uma linha de atuação do Estado Brasileiro. Já em 1933, o novo governo, pelo Decreto 22.928, declara a cidade de Ouro Preto monumento nacional e, em 1934, pelo Decreto 24.735, inicia a organização de um serviço de proteção aos monumentos históricos e às obras de arte tradicionais do país.
Tendência dos estudos sobre o barroco mineiro:
- do local ao universal
- busca do diálogo com as matrizes européias.
ARQUITETURA BARROCA
- crítica modernista: dogmatismo funcionalista.
- Lúcio Costa: Panfletário assumido do “funcionalismo corbusiano” e divulgador dos dogmas da arquitetura moderna desde o lançamento do seu ensaio crítico “Razões da nova arquitetura”, de 1934, Lucio Costa começa a usar a história da arte e da arquitetura para comprovar os conceitos modernistas que são, na sua visão crítica, a verdadeira e única fonte para a apreciação da arquitetura. Assim, a análise do objeto arquitetônico é baseada na matriz funcionalista com o viés de encontrar, unido a esse mesmo objeto, a tônica do aspecto social, tecnológico, plástico e artístico refletindo as verdades construtivas do seu tempo.
- Lucio Costa inicia um trabalho de valorização estética da produção da
arquitetura setecentista mineira ligada a um purismo funcionalista à maneira da “forma segue a função” , o que explica uma série de críticas à obra do Aleijadinho relacionadas ao problema da decoração, e outras vezes o elogio, em se tratando de avanços funcionais.
Olhar de Lúcio Costa
- a vinculação aos ideais da crítica de avaliação estética
construída a partir de um olhar funcionalista, ligado aos cânones da arquitetura moderna;
- uma relação menos engajada no caso da arquitetura, mais concordante com as políticas oficiais sobre a originalidade da arte mulata mineira;
- e por último, na crença, como metodologia de análise crítica das obras de arte e arquitetura, nos sistemas de evolução crescente da evolução artística: nascimento, amadurecimento, apogeu e decadência.
Olhar de Lourival Gomes Machado
- a concepção teórica, hoje bastante desgastada, da autenticidade do chamado “Barroco mineiro” como um “movimento” à parte e sem conexão mais diretas com o cenário da arte nacional do período . Neste sentido, o trabalho de Lourival Gomes Machado ancora-se na avaliação crítica sobre o diferencial estético das obras vinculadas ao ciclo do ouro, visando identificar alguns princípios gerais que estão presentes na sua qualificação artística, trabalhando fundamentalmente conceitos como sua pretensa originalidade e a sua inserção no seio da cultura barroca.
- A partir do parâmetro teórico fundamentado em Balet, Lourival Gomes Machado passa a buscar nas obras do Barroco mineiro, principalmente nas igrejas, a representatividade que as caracterizavam como as mais importantes estruturas transmissoras do espírito barroco na paisagem de Ouro Preto e lança a hipótese de serem possuidoras de um esforço de representação do poder político da Coroa Portuguesa.
- Segundo a visão de Machado, o caráter barroco dessas obras fica retido nos domínios do espaço interior do edifício e, principalmente, na própria implantação das construções religiosas, ou seja, no contraste das suas fachadas lisas, planas e alvas com o sítio monumental e com o céu azul, sem que competisse com a “natureza ciclópica” da paisagem de Ouro Preto.
Olhar de Sylvio de Vasconcellos
- Reafirmando sua vinculação às raízes modernistas, o autor também trabalha com exaustão a defesa da originalidade do “Barroco mineiro”, mais uma vez caracterizado como um episódio particularizado dentro da arte colonial brasileira.
- Sylvio de Vasconcellos, por fim, partiu para a defesa da idéia de que a arquitetura
mineira, adaptando-se a todas as dificuldades impostas pelo meio hostil e pela condição de isolamento geográfico da região no século XVIII, soube enfrentar e tirar partido das suas próprias limitações para construir, com um caráter original, suas realizações arquitetônicas. Estas seriam vinculadas às soluções da tradição construtiva do mundo português, muitas vezes improvisadas em função das privações do meio.
- crença na linearidade evolutiva, que leva a evolução da arquitetura mineira dentro de uma lógica cartesiana, das plantas retangulares rumo as plantas curvas ao avançar do século XVIII.
Olhar de Bazin
- A concepção de Bazin, ancorada na aliança entre arquitetura e decoração no espaço
interior das igrejas, norteará a análise de todos os objetos por ele selecionados, privilegiando uma crítica constituída a partir da apreensão geral do edifício, da avaliação estética da unidade indivisível das igrejas e dos conventos.
Olhar de Robert Smith
- Como historiador, Smith fundamenta sua produção sobre a arte barroca no Brasil na
compreensão da arquitetura lusitana e da arquitetura colonial brasileira, trabalhadas como fenômenos indissociáveis por meio de categorias de análise dependentes.
- Trabalhando sua análise crítica a partir da impossibilidade de qualquer avanço criativo e de autonomia artística em terras brasileiras, Smith entendia a produção brasileira como apêndice necessário da produção portuguesa. Neste sentido, sua interpretação artística do monumento se dava em função de uma preocupação única com o seu processo formativo.
- mesmo nos episódios da arquitetura brasileira amplamente celebrados pela história da arte, o autor os absorve como meras imitações de modelos europeus, como o que acontece quando o autor investiga a procedência da solução inovadora de algumas igrejas brasileiras setecentistas que assumem uma complexa conformação volumétrica, dificilmente encontrada em edifícios lusitanos.
- a tendência ao movimento, à sinuosidade, à interpenetração espacial é justificada por uma suposta derivação destas construções a obras de importância secundária no cenário da arte lusitana, igrejas que nunca poderiam ser comparadas aos monumentos erigidos em território colonial.
- Dentro desse quadro, as mais importantes contribuições que Robert Smith pôde dar para o estudo da cultura arquitetônica setecentista em Minas Gerais, virão, no nosso modo de ver, da releitura e compatibilização de seus trabalhos sobre a arquitetura portuguesa , seus arquitetos e forma de produção, com ênfase na região do Porto e de Braga.
Olhar de John Bury
- Nos ensaios de John Bury, pela primeira vez na historiografia sobre a arte mineira, aparece um autor que trata da arte e da arquitetura barroca mineira como um fenômeno mais universal, e não limitado às particularidades do meio, com ênfase em uma cultura arquitetônica que permeava uma produção internacional. Trabalhando a questão do Barroco dentro desse contexto mais universal, ligado aos movimentos internacionais vinculados ao Maneirismo, ao Barroco e ao Rococó internacionais, Bury rompe com a visão mais restrita dessa produção artística colocada pelos críticos brasileiros.Em textos como “A Arquitetura e a Arte do Brasil Colonial” pela primeira vez aparece uma associação direta da produção da arte e da arquitetura brasileira com a tratadística em vigor no período, principalmente Serlio, Vignola, Scamozzi e mesmo o tratado português “Artefactos Simétricos”
- Neste sentido, relacionou, como já colocamos anteriormente, a produção da arte e da arquitetura setecentista mineira com as fontes e a produção do que fazia-se de mais significativo em toda a Europa nos períodos Maneirista, Barroco e Rococó, ainda que em terras brasileiras estas manifestações se impusessem com um certo atraso cronológico.
- Outro aspecto relevante da obra de Bury é a compreensão do valor da arte setecentista mineira, independente de seus modelos europeus. Bury compreendeu o componente de originalidade brasileiro sem problemas, idéia, como vimos, jamais aceita por Robert Smith. Dentro das novas análises empreendidas por Bury, é particularmente importante a consciência que o historiador inglês demonstra em relação à influência do Maneirismo e sobre a ligação do “estilo” com as primeiras manifestações da arquitetura religiosa em território nacional.
- Dentro desse espírito e não sendo cerceado pelas influências oficiais, o autor parte para a investigação das origens da arquitetura mineira, buscando as fontes para essa aclamada erudição compositiva não na originalidade da cultura mulata, como os outros autores estudados o fizeram, mas nos modelos europeus e no estudo da cultura arquitetônica vigente nos séculos XVII e XVIII.
- Origem das igrejas borromínicas (São Pedro dos Clérigos e Rosário dos Homens Pretos): Para John Bury, a origem formal dessas tipologias está no Piemonte (região ao norte da Itália), na Áustria, na Baviera (região ao sul da Alemanha) e na Boêmia (região que compreendia territórios das atuais República Tcheca e Hungria), onde existem exemplos diversos de plantas curvilíneas que praticamente inexistem na tradição portuguesa.
Olhar de Affonso Ávilla
- Para Affonso Ávila, para se entender o fenômeno Barroco em Minas Gerais é imprescindível entender a idéia daquelas manifestações artísticas com o compromisso do “estilo” com a Contra-Reforma e a expansão mercantilista européia, abre um novo universo de conquista de fiéis para a igreja renovada, além de oferecer um imenso espaço para seu o desenvolvimento em território pouco explorado. Assim, o autor defende a idéia que o “espírito barroco” deve ser encarado independente do contexto geográfico e temporal, mas fazendo parte da manifestação artística a que está ligado.
- O autor, dentro dessas premissas, defende que a singularidade do fenômeno artístico do Barroco em Minas Gerais está na capacidade da arte na região de Minas poder absorver uma tonalidade própria, principalmente em função dos condicionantes especiais que caracterizam o cenário aurífero. Segundo o pensamento do autor aspectos como: a luz, a cor, a paisagem, a topografia da região montanhosa, os materiais disponíveis, a diversidade étnica permitiram a gênese de um Barroco autenticamente brasileiro, regido pelos mesmos princípios essenciais do fenômeno na Europa, mas formalmente inédito.
Olhar de Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira
- em muitos dos seus estudos, Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira tem
demonstrado que a idéia da originalidade das manifestações artísticas da região aurífera está vinculada, como já salientamos inicialmente, à política oficial do IPHAN do tempo dos modernistas e ao desejo incondicional da vanguarda modernista brasileira de descobrir um marco inicial de uma “identidade nacional”. Para o enfrentamento destas idéias “oficiais” sedimentadas, foi fundamental, na trajetória da autora, a publicação – onde a pesquisadora é a organizadora – dos textos do crítico inglês John Bury (BURY, 1991), já comentados anteriormente. Para abrir uma discussão sobre o mito do “Barroco mineiro”, balizado, como vimos, pela obra de Bazin e de outros intelectuais significativos da cultura brasileira, seria imprescindível que um outro autor, produzindo no mesmo período textos sobre o Barroco brasileiro com uma visão bastante diferente, viesse à tona e levantasse algumas questões fundamentais sobre o tema.
- É também Myriam Ribeiro quem primeiro propõe, de uma maneira mais incisiva, a permanente influência dos modelos externos para a arte mineira, rompendo de vez com a idéia do mito da originalidade mulata e, principalmente, com teses evolutivas propostas de maneira quase constante, como vimos, pelo “staff” modernista dos pesquisadores vinculados ao IPHAN.
A expressão “Barroco mineiro”, geralmente aplicada a toda arquitetura religiosa edificada em Minas setecentista, recobre efetivamente um universo estilístico muito mais amplo, que vai das construções retangulares da primeira metade do século XVIII às sinuosas da segunda metade, passando pelas curvilíneas ou de oposição côncavo-convexas de meados do século. São três estilos arquitetônicos diferentes que, em princípio, podem ser relacionados aos três principais estilos da época, no
cenário internacional do período correspondente aos séculos iniciais da nossa história, ou seja, o Maneirismo, o Barroco e o Rococó.(Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira)
- Partindo do estudo do surgimento do Rococó enquanto estilo de corte e sua expansão na Europa como estilo também religioso, a autora, seguindo o caminho iniciado por
pesquisadores como Marie-Therèse Mandroux-França e do próprio Robert Smith e ampliando seu foco, para chamar atenção para a importância das gravuras de arquitetura em circulação na Europa como fonte de inspiração e modernização cultural para os “arquitetos” erudidos e amadores em Portugal e suas colônias . Na sua obra mais recente, a pesquisadora enfoca o estudo das fontes impressas circulantes na Europa sobre arte e arquitetura no século XVII e XVIII, conjuntamente com a análise da produção arquitetônica do período em Portugal e no Brasil, conseguindo, assim, comprovar uma série de hipóteses já levantadas sobre a circularidade cultural na região das Minas Gerais e abrindo campos de pesquisa ainda a serem investigados, sendo um desses o nosso próprio tema de pesquisa nessa tese: a cultura arquitetônica em Portugal no século XVIII e sua relação com a formação dos mestres-de-obras portugueses imigrados para as Minas setecentistas.
Proposta de Dangelo
- Para um estudo que traga novas perspectivas historiográficas sobre a produção mais coletiva da arquitetura mineira setecentista e do papel dessa produção para aquela sociedade, no nosso ponto de vista, é imprescindível conhecer os valores culturais vigentes no período estudado e as formas de produção que regem o universo arquitetônico no século XVIII em Portugal, no Brasil, e em Minas, o que nos propomos a fazer como linha principal desta pesquisa a partir de uma metodologia de estudo que envolva trânsito da cultura arquitetônica vigente em Portugal, no Brasil e em Minas durante o século XVIII; circularidade cultural dos agentes dessa produção e verificação da aplicação dessa cultura arquitetônica na produção arquitetônica dos principais agentes culturais ligados à produção arquitetônica setecentista mineira, onde atuaram como empreiteiros, arquitetos e construtores.
terça-feira, 8 de setembro de 2009
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link para baixar diretamente a tese de Andre Dangelo:
ResponderExcluirhttp://rapidshare.com/files/227515669/Tese_Andre_Dangelo.pdf.html