terça-feira, 23 de junho de 2009

O fim do imaginário

As figuras do imaginário tradicional dominam ainda a pintura francesa na primeira metade do século XIX. Aí cada imagem se faz signo de uma outra, e é tomada de empréstimo da reserva de um mundo, de um imaginário e de um conhecimento que contém tudo o que merece ser representado - o artista escolhe o mais digno objeto, o melhor momento, o melhor estado.
Com Manet, o que surpreende é um tipo de presença absoluta da imagem. Ela é certamente menos estritamente enquadrada, ela é mais aberta - e no entanto, ela possui um tipo de independência: a cena se desenrola aqui, agora, diante de nós, e a atitude dos personagens não é o resultado de uma ação anterior, ela é o fato do momento, ela não tem uma história, mas apenas uma presença. Com Manet, o representado remete menos ao representado (ao seu conjunto ou uma de suas partes) do que à representação em si. A cena não é mais imaginada, mas vista: ela não é uma escolha entre as imagens escolhidas do imaginário.
Fim do imaginário, fim de tudo aquilo que pertence a uma memória e aos sonhos coletivos, fim dos modelos que a vida individual não reencontra mais, mas pode reconstituir, reanimar: lendas e mitos, grandes ações e grandes figuras de história, figurações ideais de beleza, objetos ideais do desejo. Fim do mundo como conjunto, como totalidade no espaço, fim do mundo como hierarquia em relação a qual cada imagem escolhida se situa e se justifica.
A partir de 1863, a história da pintura será essencialmente a história de uma percepção e não de um imaginário: o cubismo, a abstração, a ação de pintar são as consequencias de uma pintura do percebido.

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